Hara
(腹)
significa literalmente barriga, correspondendo à parte inferior do
abdômen.
Como
para quase todas as palavras japonesas, o Hara também possui um
significado mais amplo do que tem para os ocidentais a palavra
barriga. Segundo Karlfried Graf Durckheim, “o Hara é o centro do
corpo humano; mas, como o corpo é mais do que um mero corpo físico,
é mais do que algo biológico e fisiológico. Ele significa ao mesmo
tempo o centro espiritual”.
Deste
modo além de ser a região que acomoda o centro físico do corpo,
possui uma conotação psicológica. Assim uma pessoa com Hara
apresenta-se centrada, ou melhor, concentrada (com centro, que possui
um centro), mostrando-se serena, paciente em todas as situações e
sempre com tempo, pode tranqüilamente observar e não ter de atacar
imediatamente quando algo a desagrada, apresentando uma grande paz
interior. Pelo fato de não depender do julgamento de outras pessoas,
ela se entrega ao mundo sem se importar com a impressão que causa,
pois sua autoconsciência se fundamenta no Hara.
O
Hara é, sobretudo o resultado de constantes exercícios individuais
e da disciplina, conseqüência de um desenvolvimento pessoal
responsável.
Nas
palavras de Karlfried Graf Durckheim: “O ponto de gravidade
verdadeiro, que se manifesta tanto no comportamento físico como no
espiritual e mental, é, portanto expressão do homem todo que, como
pessoa, está se desenvolvendo para ter uma constituição adequada à
essência a que faz jus no mundo. O Hara, entendido como centro
verdadeiro, é o pressuposto, a expressão e forma de confirmação
da vida dessa pessoa que corresponde na sua totalidade espiritual e
corporal à verdadeira relação com o céu e a terra, com o mundo e
consigo mesma”.
Não
é possível tornar-se um homem completo sem o Hara, sem a conquista
do centro físico espiritual. O mais tenaz rival no caminho da
obtenção da força do centro é o pequeno ego que, com sua
teimosia, sempre perturba o testemunho de qualquer conhecimento. Toda
ação fundamentada no pequeno ego é permeada pela preocupação de
que o esforço possa falhar e de que esse fracasso prejudique a
posição do ego, mesmo que se trate de uma simples perda de
prestígio.
Nas
artes marciais, todos os movimentos começam no Hara e a origem do
poder marcial reside na verticalidade. Todo movimento e todo poder
deve ser uma manifestação, sem esforço físico, do Hara. Esse
centro é o único local do ser que permanece firme e estável. O
Hara funciona como um receptor da energia do céu e da terra
convergindo-a para dentro do corpo. Quando se concentra no Hara, a
postura torna-se naturalmente ereta.
A
concentração na verticalidade gera uma tensão dinâmica que une
verticalmente a energia espiritual do Hara com a energia mental da
vontade presente no cérebro, dando origem a um grande poder
corpo/mente: pensa-se com o Hara (hara de kangaeru) e age-se a
partir do Hara (hara de yaru). O céu (a mente) e a terra (o
corpo) se unem pelo espírito (a vontade).
Hara
significa o centro de gravidade correto.
Morihei
Ueshiba disse: “O Aikido é o princípio da não-resistência.
Aquele que é não-resistente é vitorioso desde o início. Um
verdadeiro guerreiro é invencível porque ele não se opõe a nada”.
Quando
se começa a renunciar ao ego (os pensamentos de autoproteção e
autopreservação), aquela parte nossa que antes se julgava como algo
separado do todo, uma força sutil passa a fluir através do
praticante e ele, então, começa a seguir o princípio taoísta do
wu-wei, o fazer-sem-fazer, fazer sem esforço, suave e
naturalmente, sem nenhum envolvimento físico ou psicológico
desnecessário. O praticante simplesmente faz o que sabe, sem alardes
e sem pretensões - os resultados vêm por si mesmos. Desta forma não
se tenciona nem se cansa, conservando-se alerta, receptivo e sensível
à energia do oponente. É quando a verdadeira técnica surge, pois
não é o ego que a executa, mas começa a aflorar um poder natural,
o verdadeiro Aikido. Como diz Morihei Ueshiba: “O progresso no
Aikido avança na proporção da descoberta de um poder natural, uma
essência orgânica, dinâmica, dentro de si mesmo. É um caminho
onde a pessoa encontra progressivamente o verdadeiro eu, com surpresa
e alegria; o eu exilado, escondido, com seu inesgotável potencial,
permanece despercebido por muitas pessoas que morrem sem sequer saber
que ele existe”.