segunda-feira, 11 de junho de 2012

Hara e Tanden - primeira parte


Hara () significa literalmente barriga, correspondendo à parte inferior do abdômen.
Como para quase todas as palavras japonesas, o Hara também possui um significado mais amplo do que tem para os ocidentais a palavra barriga. Segundo Karlfried Graf Durckheim, “o Hara é o centro do corpo humano; mas, como o corpo é mais do que um mero corpo físico, é mais do que algo biológico e fisiológico. Ele significa ao mesmo tempo o centro espiritual”.

Deste modo além de ser a região que acomoda o centro físico do corpo, possui uma conotação psicológica. Assim uma pessoa com Hara apresenta-se centrada, ou melhor, concentrada (com centro, que possui um centro), mostrando-se serena, paciente em todas as situações e sempre com tempo, pode tranqüilamente observar e não ter de atacar imediatamente quando algo a desagrada, apresentando uma grande paz interior. Pelo fato de não depender do julgamento de outras pessoas, ela se entrega ao mundo sem se importar com a impressão que causa, pois sua autoconsciência se fundamenta no Hara.
O Hara é, sobretudo o resultado de constantes exercícios individuais e da disciplina, conseqüência de um desenvolvimento pessoal responsável.
Nas palavras de Karlfried Graf Durckheim: “O ponto de gravidade verdadeiro, que se manifesta tanto no comportamento físico como no espiritual e mental, é, portanto expressão do homem todo que, como pessoa, está se desenvolvendo para ter uma constituição adequada à essência a que faz jus no mundo. O Hara, entendido como centro verdadeiro, é o pressuposto, a expressão e forma de confirmação da vida dessa pessoa que corresponde na sua totalidade espiritual e corporal à verdadeira relação com o céu e a terra, com o mundo e consigo mesma”.
Não é possível tornar-se um homem completo sem o Hara, sem a conquista do centro físico espiritual. O mais tenaz rival no caminho da obtenção da força do centro é o pequeno ego que, com sua teimosia, sempre perturba o testemunho de qualquer conhecimento. Toda ação fundamentada no pequeno ego é permeada pela preocupação de que o esforço possa falhar e de que esse fracasso prejudique a posição do ego, mesmo que se trate de uma simples perda de prestígio.
Nas artes marciais, todos os movimentos começam no Hara e a origem do poder marcial reside na verticalidade. Todo movimento e todo poder deve ser uma manifestação, sem esforço físico, do Hara. Esse centro é o único local do ser que permanece firme e estável. O Hara funciona como um receptor da energia do céu e da terra convergindo-a para dentro do corpo. Quando se concentra no Hara, a postura torna-se naturalmente ereta.
A concentração na verticalidade gera uma tensão dinâmica que une verticalmente a energia espiritual do Hara com a energia mental da vontade presente no cérebro, dando origem a um grande poder corpo/mente: pensa-se com o Hara (hara de kangaeru) e age-se a partir do Hara (hara de yaru). O céu (a mente) e a terra (o corpo) se unem pelo espírito (a vontade).
Hara significa o centro de gravidade correto.
Morihei Ueshiba disse: “O Aikido é o princípio da não-resistência. Aquele que é não-resistente é vitorioso desde o início. Um verdadeiro guerreiro é invencível porque ele não se opõe a nada”.
Quando se começa a renunciar ao ego (os pensamentos de autoproteção e autopreservação), aquela parte nossa que antes se julgava como algo separado do todo, uma força sutil passa a fluir através do praticante e ele, então, começa a seguir o princípio taoísta do wu-wei, o fazer-sem-fazer, fazer sem esforço, suave e naturalmente, sem nenhum envolvimento físico ou psicológico desnecessário. O praticante simplesmente faz o que sabe, sem alardes e sem pretensões - os resultados vêm por si mesmos. Desta forma não se tenciona nem se cansa, conservando-se alerta, receptivo e sensível à energia do oponente. É quando a verdadeira técnica surge, pois não é o ego que a executa, mas começa a aflorar um poder natural, o verdadeiro Aikido. Como diz Morihei Ueshiba: “O progresso no Aikido avança na proporção da descoberta de um poder natural, uma essência orgânica, dinâmica, dentro de si mesmo. É um caminho onde a pessoa encontra progressivamente o verdadeiro eu, com surpresa e alegria; o eu exilado, escondido, com seu inesgotável potencial, permanece despercebido por muitas pessoas que morrem sem sequer saber que ele existe”.